-
Daí o filme termina e você tá de boca aberta, emocionado, impressionado. Na verdade você já tinha ficado assim muito antes do filme acabar, mas aquele pianinho maldito teima em aparecer nos momentos chave e você teima em ficar emocionado. Que filme é esse, meu Deus?
Eu lembro que, pouco antes de Love, Sex aur Dhokha (Amor, Sexo e Traição) entrar em cartaz, em março de 2010, polêmicas rondaram o mundo do cinema indiano. A censura da democracia indiana baixou sobre Dibakar Banerjee, obrigando que ele cortasse ou mudasse cenas de sua obra, uma das mais revolucionárias da história da Índia. E cortasse o que? Cena de sexo, questões de castas entre personagens e letra de música. Coisas que a Índia ainda não sabe lidar, coisas comuns, coisas que fazem parte de um cotidiano quase desvelado, quase banal, quase aceito.
E no fim, a censura (sob a égide do Central Board of Film Certification), deu uma classificação A pro filme, que restringe a obra somente para adultos, ou seja, acima de 18 anos. E para aqui minha compreensão ocidental a respeito disso; se o que vi em LSD foi muito menos explícito que em milhares de filmes do nosso lado do mundo, realmente não entendo o que pode um adulto indiano ver, de acordo com esse famigerado órgão podador do cinema indiano.
Mas polêmicas a parte, LSD é um filme mesmo bastante impressionante. Ele poderia bastar pelo conteúdo - que vamos tratar adiante - mas a forma por si só também impressiona. Dibakar Banerjee começou a revolução ao fazer deste filme o primeiro do cinema indiano a ser integralmente produzido digitalmente. É um pouco estranho pensar que isso só foi acontecer na Índia em 2010, mas no país das tradições, romper com o cinema da película pra passar pro mundo digital é efetivamente um passo imenso. Mas não era dessa forma que eu me referia no começo do parágrafo.
O filme é composto por três partes, cada parte conta uma história diferente e todas as três se entrelaçam. Até aí nada de tão especial. O que Dibakar optou por fazer foi abdicar da câmera do diretor, dos planos e contraplanos, das câmeras subjetivas e objetivas, pra assim compor cada história a partir de uma câmera que faça parte do nosso cotidiano, em maior ou menos grau.
É assim que na primeira história acompanhamos as dificuldades de um estudante de cinema que, para se formar, tem que apresentar um pequeno filme. E, dessa forma, vemos essa primeira parte a partir da câmera de Rahul, o estudante. Sabiamente, Dibakar escolheu essa história pra ser a primeira do filme, porque ela será a mais impactante de todas, a mais perversa e, todas as vezes que ela se cruzar com as duas outras histórias seguintes, qualquer clima que houver vai, inevitavelmente, virar emoção.
A segunda história se passa em uma espécie de loja de conveniência, ou mini mercado. Dessa vez vemos o filme a partir das câmeras de segurança dessa loja. A história de desenrola a partir da ideia brilhante (not really) de um dos funcionários de transar na loja com outra funcionária e, assim, gravar a cena com uma das câmeras da própria loja.
Finalmente, a terceira história é gravada com câmeras escondidas de um repórter frustrado. Na desilusão, ele se depara com uma dançarina talvez mais frustrada e desiludida que ele, mas que será seu trunfo jornalístico.
O filme é genial do começo ao fim. Voltando à primeira história, há toda uma sátira ao jeito indiano de ser com o cinema, que é impossível não rir, não achar bizarro, principalmente pelo fato de serem indianos (leia-se Dibakar Banerjee e sua equipe) zoando eles próprios. E como praticamente só indianos sabem fazer, é nesse jogo de sátira e realidade nua - eu disse nua - que está a grande sacada.
A crítica indiana recebeu o filme da melhor forma possível, sobretudo pelas atuações - impecáveis - de atores desconhecidos e pela excelente edição, além, é claro, pela originalidade da forma e do conteúdo. Mas, como não é surpresa, LSD não fez uma bilheteria boa. Atores desconhecidos, tema complexo e classificação etária para maiores de 18 anos é a receita certa pra fazer de um filme indiano um fracasso de bilheteria.
Mas Dibakar fincou mais fundo sua bandeira na intersecção do cinema independente indiano com Bollywood, neste caminho sem volta. No Filmfare Awards entregue em 2011, o filme levou o prêmio de melhor edição e melhor desenho de som.
É isso, algo a não se perder e Dibakar é alguém a não se perder de vista. Se dizem que pra se chamar de "obra" alguém tem que ter feito mais de dez filmes, Dibakar Banerjee está indo no caminho certo com seus outros dois filmes, Khosla Ka Ghosla e Oye Lucky! Lucky Oye!.
Aqui vai o trailer de LSD:
-