Hoje foi o dia de ir ver Bilal na 33ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Já adianto que será um pouco difícil escrever sobre este documentário. Pra começar, não sendo um filme, não há aqui espaço pra ficar contando a historinha, descrevendo o roteiro. Não, Bilal é um documentário e, assim sendo, mostra um caso real. E o que vi não é tão fácil de descrever.
Bilal é um menino de três anos de idade, filho de pais cegos e irmão de um menininho de um ano e meio. Moram todos dentro de um pequeno cômodo num bairro pobre de Calcutá. O próprio fato de pai e mãe serem cegos já merecia um documentário, mas a realidade é mais cruel ainda. O fardo dos pais cegos recai-se sobre o pequeno garoto, que tem sobre si a imensa responsabilidade de ser, na prática, os olhos da casa.
A incrível inteligência de Bilal surpreende, mas é também responsável por fazer dele uma criança muito travessa, pra não dizer violenta mesmo. O que vem primeiro não importa, mas o fato é que assim como ele apronta muito, na mesma medida ele apanha também muito. E antes fosse somente dos pais cegos que ele apanhasse; o garoto leva também da criançada da vizinhança, do menino que vai em casa ensiná-lo a ler, da avó, do tio... e ele revida como pode.
A cena chave do documentário é num momento em que, após ver a violência subjetiva instaurada por todos os lados, ele vai pra um canto com um ursinho de pelúcia e uma caneta e simplesmente enfia a caneta na cabeça do ursinho.
Num dado momento a mãe é questionada do por quê bater tanto no menino, e a resposta é seca e objetiva: "você não está aqui o tempo todo; eu sei o que acontece e o que tem que ser feito. Ele é muito levado e precisa aprender". Curiosamente, em muitos outros momentos os pais parecem ser muito carinhosos e isso percebe-se ser algo realmente natural também. É também real o fato de que Bilal consegue divertir-se no meio disso tudo, com muita espontaneidade e muita simplicidade.
É apenas uma criança.
Tudo o que se vê é angustiante do começo ao fim. A sala do Cine Olido, no centro de São Paulo, não estava muito cheia e umas cinco pessoas levantaram-se e foram embora antes de o filme terminar. Ver tudo isso não é fácil, mas mais difícil ainda é aceitar a realidade, é aceitar a violência humana levada de maneira tão natural.
Este documentário foi produzido e dirigido por Sourav Sarangi, com apoio do Ministério das Relações Exteriores da Finlândia. Sourav diz, no começo do filme, que conheceu Bilal quando sua esposa disse à ele que havia num hospital um bebê de oito meses com traumatismo craniano, cujos pais eram cegos. O desenrolar da história resultou nesse documentário.
Vejam abaixo o trailer deste documentário. E quem quiser, é possível assisti-lo inteiro, com legendas em inglês, aqui.